4 de julho de 2011

Sobre a Ilusão


A idéia de que não conhecemos do real senão o que nele introduzimos, ou seja, que não conhecemos do real senão a nossa intervenção nele, está bem expressa no princípio da incerteza de Heisenberg: não se podem reduzir simultaneamente os erros da medição da velocidade e da posição das partículas; o que for feito para reduzir o erro de uma das medições aumenta o erro da outra. Este princípio, e, portanto, a demonstração da interferência estrutural do sujeito no objeto observado, tem implicações de vulto. Por um lado, sendo estruturalmente limitado o rigor do nosso conhecimento, só podemos aspirar a resultados aproximados e por isso as leis da física são tão-só probabilísticas. Por outro lado, a hipótese do determinismo mecanicista é inviabilizada uma vez que a totalidade do real não se reduz à soma das partes em que a dividimos para observar e medir. Por último, a distinção sujeito/ objeto é muito mais complexa do que à primeira vista pode parecer. A distinção perde os seus contornos dicotômicos e assume a forma de um continuum. O rigor da medição posto em causa pela mecânica quântica será ainda mais profundamente abalado se se questionar o rigor do veículo formal em que a medição é expressa, ou seja, o rigor da matemática. É isso o que sucede com as investigações de Gödel(...)”.

Extraído do texto Um discurso sobre as ciências na transição para uma ciência pós-moderna de Boaventura de Sousa Santos


Descartes e a Dupla Fenda

René Descartes, filósofo do século XVII, nos mostra em suas Meditações Metafísicas, que nossos sentidos podem nos enganar no momento em que desejamos produzir conhecimento, e que não é prudente nos fiarmos inteiramente neles para tal fim.
O enunciado que ficou conhecido como princípio da incerteza formulado inicialmente pelo físico Heisenberg em 1927, parece dialogar com a filosofia de Descartes.

Segundo o princípio da incerteza, as descrições do ser como onda e como
partícula se excluem mutuamente. Embora ambas sejam necessárias à compreensão
integral do que o ser é, somente uma está disponível num determinado momento do
tempo. Consegue-se medir ou a exata posição de algo (como um elétron) quando ele se
manifesta como partícula, ou seu momentum (sua velocidade) quando ele se expressa
como onda, mas nunca se consegue uma medida exata de ambos a um só tempo.
A charada da medição dos elétrons é um pouco como a dinâmica de uma primeira
entrevista psiquiátrica na qual, idealmente, o psiquiatra gostaria de saber tanto os fatos
relevantes do histórico do paciente como também estabelecer algum tipo de relação com
ele. O problema é que, se o psiquiatra faz perguntas factuais para conseguir o histórico,
recebe respostas factuais, e o paciente em si, seu modo de ser naquele momento, fica em
segundo plano. Em contrapartida, se o psiquiatra decide abandonar as perguntas para
ouvir de forma mais criativa e receptiva, conseguirá "sentir" o paciente muito bem,
porém chegará ao fim da entrevista sabendo muito pouco do histórico. Colheita de fatos
e criação de um relacionamento parecem se excluir e, no entanto, ambos são necessários
para formar um quadro completo do estado do paciente.”

Assim parece não ser através da observação e posterior constatação de algo que se encontra o alicerce seguro da ciência. Pois como demonstra o princípio, não é possível, em última escala de análise, afirmar o comportamento do mais íntimo da matéria com total segurança. O que acaba reverberando em tudo o mais que é composto por ela, ou seja, o que chamamos de realidade.

Para vários pensadores, o princípio da incerteza de Heisenberg, pode ser considero um dos principais fatores que contribuíram para uma mudança de paradigma na ciência.

O experimento realizado primeiramente pelo físico Thomas Young, chamado de “experimento da dupla fenda”, mostra o comportamento dual da matéria.